15 julho, 2007

Organizar a luta social: prioridade da esquerda socialista no 2º semestre

Escrito por Fernando Silva
06-Jul-2007

Entre os próximos dias 1º e 7 de setembro será realizado o Plebiscito Popular, que coloca em debate à população quatro questões candentes da pauta de interesse das classes trabalhadoras e do povo: a questão da re-estatização da Vale do Rio Doce, a questão do pagamento dos juros da dívida pública, a reforma da previdência e o controle do setor energético.

O Plebiscito está sendo organizado por dezenas de entidades dos movimentos populares como Assembléia Popular, MST, Pastorais Sociais, Comitê Nacional pela Anulação do Leilão de Privatização da Vale, Intersindical, Conlutas, entre tantas outras.

Para o dia 24 de outubro, no momento da realização da 2º Assembléia Popular, um conjunto de entidades que vem construindo uma agenda unitária de lutas, como a jornada do dia 23 de maio, prepara a realização de uma grande marcha a Brasília, com uma pauta unificada de reivindicações populares.

São estas duas atividades que darão uma expressiva continuidade a um processo vivo de reorganização dos movimentos e lutas sociais, que teve destaque no 1º semestre deste ano.

Ao mesmo tempo em que se colocam em andamento a preparação dessas duas grandes atividades, nos podres poderes republicanos, na corte do Senado, em especial, avolumam-se os lances diários de extraordinária desfaçatez.

Enquanto essa lamentável instituição se revela cada vez mais odiosa diante da população, os trabalhadores que se destacam nas lutas sociais são punidos e difamados: sem-terra, controladores de vôo, metroviários, estudantes. Cortadores de cana no Pará e no estado de São Paulo vivem no limite do trabalho escravo, sob uma super- exploração medonha.

Mas nada mais distante dessa realidade do que a corte em Brasília, empenhada em salvar alguns "reis do gado". Esse cenário político recoloca no âmbito da esquerda brasileira combativa e do conjunto dos movimentos um antigo e prático debate: a prioridade da política e da atividade dos partidos da esquerda socialista e dos movimentos sociais deve estar em uma luta pela ética na política e pelo resgate das instituições parlamentares, ou deve estar voltada para a organização da luta nos movimentos sociais das classes trabalhadoras, em torno da pauta das demandas sociais mais urgentes, como as que o Plebiscito Popular coloca?

A denúncia da corrupção no Estado brasileiro e suas instituições só faz sentido para que consigamos mostrar à população que não existe possibilidade de ética nessa política institucional, que tem, por exemplo, um Senado onde 32 dos seus titulares respondem por processos judiciais e investigatórios.

Isso fica claro a cada dia que passa, graças inclusive à didática contribuição do Congresso Nacional, das promíscuas relações entre empresas e poder público em todos os níveis, com incontáveis exemplos, desnecessários de serem citados, dado o volume e grau de publicidade dos fatos.

De outro lado, limitar ou priorizar a luta ao eixo da corrupção e pela ética na política pode conduzir à reedição do erro que levou a maior parte da esquerda brasileira a dar quase absoluta prioridade pela estratégia institucional desde os anos 90, desenvolvendo as ilusões de que esse caminho trilhado, com a resultante ocupação de maiores espaços e visibilidade na mídia e, depois, em postos nos poderes Executivo e Legislativo, reformaria as instituições do Estado brasileiro.

Além disso, priorizar a questão da corrupção pode dar a entender que o problema dessas instituições é apenas moral, que bastaria derrubar os corruptos e ladrões para que as instituições do Estado capitalista brasileiro funcionassem a serviço do povo.

Já vimos esse filme antes e sabemos o seu final, pois, quando se chegou lá com essa visão, revelou-se que a corrupção é tão inerente ao funcionamento do sistema e ao Estado que os próprios reformadores de outrora acabaram entrando no jogo, como vimos à exaustão no primeiro mandato do governo Lula.

Essa corte é irreformável.

Uma campanha de fôlego que se proponha a desmascarar para valer a atual podridão institucional deve partir das demandas reais da classe trabalhadora e de uma denúncia radical do conjunto do regime político, apresentando reivindicações como, por exemplo, por um sistema unicameral e, portanto, fim do Senado, fim do sigilo fiscal e bancário de todos os ocupantes de cargos públicos.

Mas acreditamos que, no 2º semestre, o foco da esquerda socialista e combativa deve estar na organização da luta e dos movimentos sociais, para enfrentar a pauta do grande capital e seus governos.

Não devemos medir esforços para organizar o Plebiscito Popular de setembro, a marcha a Brasília em 24 de outubro e, de forma imediata, uma campanha em defesa das lideranças populares das lutas sociais que estão sendo perseguidas pelo país, como os controladores de vôo, os sem-terra, metroviários, entre tantos outros ativistas e trabalhadores criminalizados pelos podres poderes da república e seus governos.

Em tempo, as quatro perguntas do Plebiscito Popular de setembro são:

1. Você concorda que a companhia Valedo Rio Doce, patrimônio construído pelo povo brasileiro, e privatizada em 1997, deva continuar nas mãos do capital privado?


2. Você concorda que o governo continue priorizando o pagamento dos juros da dívida pública, deixando de investir em trabalho, saúde, educação, moradia, saneamento, reforma agrária, água, energia, transporte, ambiente saudável?


3. Você concorda que a energia elétrica continue sendo explorada pelo capital privado, com o povo pagando até 08 vezes mais que as grandes empresas?


4. Você concorda com a proposta de reforma da previdência que retira direitos dos trabalhadores?

Fernando Silva
é jornalista, membro do Diretório Nacional do PSOL e do Conselho Editorial da revista Debate Socialista

12 julho, 2007

Transposição do São Francisco: Reféns do equívoco

Os empresários do grande capital, principalmente, serão contemplados com as águas do rio, enquanto as populações difusas, geradoras de votos e as mais carentes em termos hídricos, aquelas que atualmente são abastecidas por frotas de caminhões pipa, continuarão desassistidas

Por João Suassuna*

Recife - Que a transposição do Rio São Francisco é um projeto polêmico, isso todos nós já sabemos. Mas não só polêmico: não temos a menor dúvida em afirmar a existência de falhas técnicas significativas no mesmo, as quais poderão resultar em graves conseqüências para o ambiente natural nordestino.

Vale mencionar, entre outras, a possibilidade real e concreta de interferência nas populações indígenas; o aumento e aparecimento de novas doenças, visto ser a água um excelente veículo condutor; a perda de terras potencialmente agricultáveis; a desapropriações e todos os conflitos que delas decorrem; a especulação imobiliária nas várzeas potencialmente irrigáveis no entorno dos canais; o incentivo à indústria da seca, através da perpetuação do desabastecimento das populações difusas; a interferência no patrimônio cultural das populações atingidas; a perda e fragmentação de áreas com vegetação nativa (de habitat e ecossistemas); a modificação da composição e o risco de redução da biodiversidade das comunidades biológicas aquáticas nativas das bacias receptoras; o risco de introdução de espécies invasoras; maior número de ocorrência de acidentes com animais peçonhentos; a aceleração do processo erosivo e de carreamento de sedimentos; a modificação no regime fluvial do rio; as perdas na geração de energia elétrica; a eutrofização dos novos reservatórios e, sobretudo, ao prejuízos ao mais vital dos recursos da natureza: a água.

Os últimos acontecimentos relativos ao início das obras da transposição em Cabrobó (PE) têm-nos preocupado sobremaneira, a ponto de conclamarmos o bom senso das partes envolvidas, principalmente do lado das autoridades responsáveis pelo projeto. O diálogo, no nosso modo de entender, é a principal saída para a solução dos impasses ali existentes.

Na nossa militância decana sobre a realidade nordestina, temos revelado a existência de alternativas mais apropriadas e mais baratas para o abastecimento da população, quando comparadas àquela do projeto da transposição. Nos referimos Atlas Nordeste de abastecimento urbano de água, editado pela Agência Nacional de Águas (ANA), em dezembro de 2006, bem como aos trabalhos de convivência com o Semi-Árido sob a responsabilidade da Asa-Brasil (Articulação do Semi-Árido brasileiro).

Para se ter uma idéia da importância delas, o Atlas Nordeste, que traça também um diagnóstico da situação hídrica da região, traz como pressuposto a perspectiva do abastecimento de um número três vezes maior de pessoas no Nordeste, quando comparado aos beneficiários do projeto da transposição, valendo-se, para tanto, da metade dos recursos previstos naquele projeto. Com a divulgação desse trabalho pela ANA, acreditamos que o governo federal passou à categoria de maior opositor do projeto de transposição das águas do rio São Francisco, não tendo sentido, portanto, a sua priorização no Plano de Aceleração do Crescimento (PAC).

Em relação aos trabalhos da ASA-Brasil, voltados para a questão da água, essa instituição propõe a captação da chuva para consumo humano e para produção de alimentos, por meio de um leque de 40 tecnologias, a exemplo das cisternas, barreiros e mandalas. Portanto, o foco dos movimentos sociais é no sentido do abastecimento humano, compreendendo a água como um direito humano fundamental.

Costumeiramente, nos reportamos, em nossos trabalhos, ao uso das cisternas rurais, como uma das melhores alternativas para o abastecimento das populações difusas da região semi-árida nordestina. Uma cisterna de 16 mil litros, por exemplo, tem capacidade para ofertar, a uma família de 5 pessoas, durante os 8 meses sem chuvas na região, água de boa qualidade para beber e cozinhar.

Entretanto, caso o governo federal venha iniciar o projeto da forma como está conduzindo as negociações, certamente estará cometendo um grande equívoco, o que, na realidade, será uma lástima. Aliás, já tivemos a oportunidade de comentar essas questões no artigo "Na iminência do primeiro equívoco", escrito em 2003.

Lamentamos, no entanto, a ótima oportunidade desperdiçada de se negociar essas questões do Nordeste Semi-Árido junto ao governo federal. Após o Santo jejum do bispo de Barra (BA), dom Luiz Flávio Cappio, o governo havia iniciado um processo de negociação junto aos movimentos sociais, fato interrompido pela proximidade do período eleitoral do ano passado e pela cassação da liminar que impedia o início das obras transpositórias. Imaginávamos, no entanto, que uma vez encerradas as disputas eleitorais, o governo voltasse à mesa de negociações. Ledo engano. O que se viu foi um governo livre de empecilhos e motivado à imposição do projeto goela abaixo do nordestino, pondo por terra todas as possibilidades de saídas dignas de seu convívio com as secas que freqüentemente assolam a região.

Outra questão que tem-nos preocupado sobremaneira diz respeito à divisão do Nordeste causada, principalmente, pela disputa das águas do Velho Chico.

Consta no projeto apenas o benefício dos Estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba e Pernambuco, o que praticamente ocasionou o desmembramento do Nordeste em duas partes: a região setentrional (aquela que irá receber as águas do São Francisco) e a região meridional (aquela que irá exportar as águas do rio). Esse fato não foi bem recebido pela população da sua parte meridional, tendo em vista ficar a região como mera exportadora de água, sem que seus habitantes tivessem participação efetiva no projeto. Isso gerou descontentamentos, o que julgamos indesejável, principalmente tendo em vista ser o São Francisco o rio da integração nacional, não devendo, portanto, servir de motivos para discórdias entre o povo nordestino. O Nordeste deveria ser considerado de uma forma global, com seus estados participando tanto das discussões como das soluções de seus problemas.

Essa questão da divisão do Nordeste ficou evidenciada recentemente em reunião realizada no Recife, na qual participaram os governadores dos estados da região setentrional, para discussão do apoio ao início das obras do projeto de transposição. A reunião foi importante porque evidenciou, de um lado, o poder de articulação dos atuais dirigentes daqueles estados, mas, de outro, deixou a desejar, pelo simples fato de não se ter dado enfoque às principais questões regionais, notadamente o abastecimento das populações difusas circunscritas no Polígono das Secas. Nesse sentido, a reunião poderia ter sido muito mais proveitosa, se realizada com a participação dos governantes de todos os estados nordestinos que sofrem a influência do fenômeno das secas, inclusive o do estado de Minas Gerais, principal exportador das águas do Velho Chico, tendo como pauta principal a discussão das propostas existentes no Atlas Nordeste do abastecimento urbano de água e a sua importância para a solução definitiva dos problemas de abastecimento de todo o Nordeste.

Para se ter idéia da importância dessas propostas, existe no Atlas da ANA a indicação de solução para os problemas de escassez hídrica na região agreste do estado de Pernambuco, através da adução (uso de tubulações) das águas do rio São Francisco. Por que não implementar essa proposta, ao invés de se começar a construir o faraônico eixo norte, em Cabrobó, cujos benefícios passarão à margem do estado? A primeira alternativa seria a mais sensata.

O foco do eixo norte é puramente econômico. Isso todos nós sabemos. Visa tão somente o benefício do agronegócio nos estados do Ceará, Paraíba e Rio Grande do Norte, numa prova de total desrespeito ao que foi deliberado pelo comitê da bacia do São Francisco, no plano decenal de uso de suas águas. Segundo consta neste plano, o uso das águas do rio, fora de sua bacia hidrográfica, é permitido apenas para abastecimento humano e animal, isso em caso de comprovada escassez.

Caso seja iniciado o projeto, entendemos que os governadores dos estados do Nordeste setentrional ficarão reféns das conseqüências desse equívoco. Os empresários do grande capital, principalmente irrigantes, industriais e carcinicultores, serão contemplados com as águas do rio, enquanto as populações difusas, geradoras de votos e as mais carentes em termos hídricos, aquelas que atualmente são abastecidas por frotas de caminhões pipa, ao perceberem que o projeto é revestido de pura ilusão, ficarão revoltadas, o que poderá resultar em desgastes políticos de conseqüências imprevisíveis.

Diante de tudo isso, cremos que ainda há tempo para se refletir sobre essas questões, envidar esforços para o retorno das negociações interrompidas e torcer para que o bom senso prevaleça na volta desse diálogo. É o que desejamos para o bem comum.

*João Suassuna é engenheiro agrônomo, pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco e um dos maiores especialistas na questão hídrica nordestina.

Para o Pan, bilhões. Para os trabalhadores, tiros, remoções e retirada de direitos.

Enquanto bilhões são gastos nos Jogos Panamericanos, o povo não tem onde morar. Não tem emprego, saúde, educação e sofre pela violência cada dia maior. Nas vésperas do Pan, vivemos um aumento da criminalização da pobreza. Essa é a explicação do massacre que ocorreu no Complexo do Alemão.

Com a desculpa da segurança, as comunidades mais pobres do Rio são ocupadas militarmente. Sofrem com o Caveirão e se promove uma chacina da polícia contra os moradores.

O governo faz de tudo para construir a imagem de uma terra de faz-de-conta simbolizada por Cauê.

Neste mundo da ilusão tudo aparece ensolarado e feliz. Enquanto isso a violenta ação dos governos remove famílias, persegue ambulantes e moradores de rua, reprime os movimentos sociais que resistem a essas ações. Como se estivessem fazendo uma "limpeza social".

Lula, Sérgio Cabral e César Maia já anunciaram que querem transformar essas mega-operações de repressão em modelo padrão de política de segurança.

Mais massacres já estão anunciados. Os próximos alvos são Maré, Mangueira, Rocinha, Jacarezinho, Providência. Portanto, não se trata de uma questão momentânea, mas sim de algo que temos que enfrentar a partir da organização de todas as forças populares. Não podemos continuar a contar cadáveres!

Saudamos os atletas e desportistas e toda a população

Saudamos os atletas e desportistas que participam dos Jogos. Mas queremos denunciar a invasão armada que sofrem nossas comunidades, o genocídio que ocorre por ocasião deste evento e o desvio e o inchaço de verbas. Em meio a uma série de irregularidades, os governos federal, estadual e municipal já gastaram cerca de R$ 5 bilhões com o Pan. É um valor quase 20 vezes superior ao que foi gasto, em média, nas edições anteriores!

Esses recursos poderiam financiar a construção de mais de 150 mil casas populares Poderiam ser investidos em áreas sociais, gerar mais empregos, melhorar a saúde e a educação. Enquanto os governos atacam os direitos dos trabalhadores, como a aposentadoria e o direito de greve, a maioria da população brasileira sofre. Sofre pelo aumento do desemprego, da fome e da miséria, que levam milhões ao desespero.

Queremos melhorar a vida para toda a população

Por tudo isso, organizamos um Ato Político Nacional, em 13 de julho, dia da abertura do Pan. Não se trata de um ato contra os Jogos, mas sim contra a lógica neoliberal que massacra milhares de famílias. É um ato de denúncia da violência, da chacina, da fome e da miséria. Contra a reforma da previdência, que dificulta ou inviabiliza a aposentadoria daqueles que dão os melhores anos de sua vida para construir este país. Contra todas as reformas que retiram os direitos dos trabalhadores e da juventude. Contra a política econômica do governo federal que privilegia o lucro de banqueiros, empresários e do agronegócio. Contra o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que quer congelar por 10 anos os salários dos servidores federais.

Ato Nacional de Luta

13 de julho – 6ª f.

Concentração a partir das 11 horas, em frente à sede da Prefeitura (Av. Pres. Vargas).



Uma manifestação pela vida e pelos direitos dos trabalhadores

Esse Ato é de apoio às lutas e greves por melhores condições de vida, salário e trabalho.

É em apoio a todos os moradores de comunidades e ocupações que resistem às remoções e despejos.

É em apoio às lutas dos estudantes pelo passe livre e por uma educação pública e de qualidade.

É uma busca para unificar as lutas dos trabalhadores empregados e desempregados da cidade, do campo e da juventude.

Essa mobilização vai denunciar os escândalos de corrupçãoque envolvem os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Vai denunciar que ao mesmo tempo em que o governo federal arrocha os salários, o presidente e os parlamentares reajustaram seus próprios salários em 29%.

Queremos deixar claro que a violência cresce no campo e na cidade, alimentada pela falta de saúde, de educação, de salário, emprego, terra e moradia. Enquanto isso não se faz Reforma Agrária, nem Reforma Urbana. Não há geração de emprego decente para o povo.

Manifestação dia 13 de julho

Por tudo isso convidamos todo o povo trabalhador a construir o Ato Nacional de Luta, no dia 13 de julho. Enquanto os poderosos gozam da satisfação de participar dos camarotes dos Jogos Pan-americanos, estaremos nas ruas do Rio, mostrando aos trabalhadores do mundo que resistimos aos violentos ataques do capitalismo.

Sabemos que só com a nossa unidade, com a continuidade da unificação de nossas lutas e mobilizações, poderemos construir uma saída dos trabalhadores para o nosso país.

Só nossa luta é capaz de garantir um melhor futuro e uma nova sociedade sem explorados e oprimidos.

* Contra a violência policial e a criminalização da pobreza e dos movimentos sociais!

* Contra as remoções e despejos!

* Contra a reforma da previdência e todas as reformas que retiram direitos dos trabalhadores e da juventude!

* Contra a política econômica do governo federal!

* Pela unificação das greves, lutas e mobilizações na cidade e no campo!

* Pelas reformas agrária e urbana!



ADUFF-SSind, ANDES-SN/RJ, ASSEMBLÉIA POPULAR, ASSIBGE-SN, Associação Nossa América, CEDAPS, CBLB, CMI/RJ, CMP, CONLUTAS, CONSELHO POPULAR, CUT/RJ, FASE RIO / FELRU (Fórum Estadual de Luta pela Reforma Urbana), FLP, Fundação Bento Rubião, GTNM, IBASE, Frente Contra Remoção e Pela Moradia Digna, INTERSINDICAL, JUSTIÇA GLOBAL, LS/Nós não vamos pagar nada, Lutarmada, Mandato Chico Alencar/PSOL, Mandato Eliomar Coelho/PSOL, Mandato Marcelo Freixo/PSOL, MNLM, Mov. Juv.Trabalhadora, Movimento Tamoio, MPL, MST, NAJUP-RJ, NPC, Núcleo Trab. Em Universidades/PSOL, PCB, PCdoB, PSTU, REDE CONTRA A VIOLÊNCIA, RENAJORP, .RENAP, SEPE, Sindsprev-RJ, SINTRASEF, SINTUFF, SINTUFRJ, SINTUPERJ, UJR, UMP

07 julho, 2007

O que é o REUNI?

Programa de Apoio à Reestruturação e Expansão das Universidades Federais

(Decreto Nº 6.096 de 24 de abril de 2007)

Uma discussão necessária!

Há cerca de 30 dias o Ministério da Educação e o Presidente Lula lançaram o PDE, Plano de Desenvolvimento da Educação. Composto por diferentes medidas para todos os níveis de educação, para a universidade ele traz um Decreto chamado Programa de Apoio a Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI).

A Juventude Revolução - IRJ se dirige a todos os estudantes, e em particular aos das universidades federais, para alertar sobre o seu significado.

O que diz o Decreto?

O texto apresenta um simpático objetivo de dobrar as vagas do ensino superior brasileiro.

Define uma ampliação de 100% do número de alunos, todavia com uma ampliação dos docentes e técnicos de aproximadamente 15%. De cara, já nos perguntamos sobre que universidade está prevista...

O Decreto traz um chamariz de ampliação de 20% das verbas no Orçamento para a adesão voluntária de Instituições Federais de Ensino Superior Federal ao programa.

O método é simples: a universidade que apresentar um projeto de reestruturação dentro das especificações exigidas receberá verba suplementar.

O objetivo, como explica o Artigo 1º do REUNI, é “criar as condições para a ampliação do acesso e permanência na educação superior, no nível de graduação, pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos nas universidades”.

Mas é o Artigo 2º que deixa claro que se trata de “revisão da estrutura acadêmica” com “a reorganização dos cursos de graduação”, segundo o seguinte critério:

“Diversificação das modalidades de graduação, preferencialmente não voltadas para à profissionalização precoce e especializada;

O que quer dizer “profissionalização precoce”? É a justificativa para a introdução dos “cursos básicos”, o “bacharelado interdisciplinar”.

É, na prática, uma condenação absurda dos jovens que buscam um diploma profissional para ingressar no mercado de trabalho pela porta de frente, como deveria ser!

Na verdade, esta “reestruturação curricular” das universidades é a abertura para a aplicação em todo Brasil do projeto Universidade Nova, inaugurado pelo Reitor da UFBA, em sintonia com o chamado Processo de Bolonha.

Reestruturação, novas arquiteturas acadêmicas... Os “Processos de Bolonha” no Brasil

O centro do Decreto do REUNI é empurrar para a reestruturação dos currículos segundo a lógica generalistas dos bacharelados interdisciplinares “não voltados para à profissionalização precoce”.

É a porta aberta para implantação da orientação do Processo de Bolonha: a desregulamentação dos currículos com a quebra geral dos diplomas (diplomas sem profissão), passando por um arrocho sobre os docentes e servidores (formadores de diploma sem profissão).

O Processo de Bolonha teve início num encontro na cidade de Bolonha (Itália) dos ministros de Educação dos países da União Européia. De lá, saíram diretrizes que tomaram o nome de Processo de Bolonha, e que passaram a ser implantadas em todos os países aderentes da UE, combinando:

  1. a introdução de “colégios universitários” com cursos básicos de onde o estudante sai formado em literalmente nada;
  2. o retardamento da formação profissional, principal objetivo para maioria dos estudantes, para períodos posteriores à graduação;
  3. a ampliação drástica do número de alunos por turma na relação dos professores
  4. a divisão entre a formação básica (em nada!), a especialização (graduação efetiva) e a pós-graduação (pesquisa), ampliando a demora para o estudante obter seu diploma.

Autonomia Universitária e Soberania Nacional

O Processo de Bolonha busca adequar a Universidade às necessidades da desregulamentação geral da economia na globalização.

Com a criação das “áreas de livre-comércio” querem destruir os diplomas nacionais. Eles são um aspecto da soberania nacional que os capitalistas querem desmontar. Afinal, a regulamentação profissional é a uma conquista inscrita em lei pelos trabalhadores.

E na América Latina, a Autonomia Universitária é uma forma da luta por uma Universidade comprometida com a Soberania Nacional. Que entra em choque com a “globalização” e dos tratados de livre-comércio, como Alca ou Mercosul.

Nosso compromisso é com os estudantes, os trabalhadores e a soberania nacional, e não com os interesses do “mercado” e da globalização!

Complementando o PL 7200/06

No Brasil, o REUNI, então, permitiria a flexibilização curricular. Ela aparecera na primeira versão do projeto de Reforma Universitária do governo federal, mas a resistência do movimento estudantil e docente obrigou o governo a manobrar.

O governo se concentrou na questão do financiamento no Projeto de Lei 7200/06 (4ª versão da reforma universitária que atualmente tramita no Congresso Nacional), introduzindo um método de distribuição de verbas pelo ranqueamento das IFES segundo de critérios de “produtividade”.

Agora, a flexibilização voltou com o REUNI. Assim, se aprovado o PL 7200/06, as IFES sub-ranqueadas na distribuição de verbas seriam mais facilmente seduzidas pela adesão ao REUNI, a condição de “reestruturarem-se” para formar os diplomados em nada. Seria uma piora geral nas universidades federais.

O exemplo da UniABC

No Brasil, podemos antecipar o significado dos ciclos básicos na Universidade Federal do ABC (SP) criada no governo Lula. Sua estrutura curricular já obedece parcialmente esse modelo. As turmas tem aulas com mais de 125 estudantes por professor!

É a universidade com salas superlotadas, sem pesquisa nem extensão universitária. É o caminho para a ruptura com um princípio inscrito na Constituição como Autonomia Universitária: “a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão” (Artigo 207 da Constituição Federal).

A isca da Assistência Estudantil

Dentro deste decreto está um item prevendo a ampliação da Assistência Estudantil. Mas sem especificar o valor nem a origem dos recursos!

Sem responder com uma ampliação de verbas, são palavras ao vento, mais parece o tempero para um prato envenenado.

Organizar nas universidades a luta

Uma distinção do REUNI é o seu modo de implantação. Diferente do PL 7200/06 que se aprovado no Congresso Nacional seria colocado em vigor em todas as universidades federais, o REUNI é um programa de adesão voluntária das universidades após decisão dos Conselhos Universitários.

Então, desde já, trata-se de colocar em todos os espaços do movimento estudantil a necessidade de em cada universidade abrir a discussão.

Aqui fazemos um alerta geral sobre o que significa a “adesão” ao REUNI. Queremos envolver na discussão toda a representação discente nos Conselhos Universitários e dialogar com os docentes e servidores.

Se a proposta de “adesão” aparecer é preciso organizar a resistência, a luta para barrá-la desde o 1º momento!

1 de junho de 2007

USP: um movimento vitorioso

Emir Sader

A greve e invasão da Reitoria da USP chega a seu final com vitória dos estudantes, funcionários e professores mobilizados pelos interesses públicos da universidade. Fazia tempo que um movimento dessa ordem não conseguia tanta adesão – das três categorias -, tanta repercussão política, tanta simpatia da população e, como resultado, uma vitória tão clara.

Seus participantes diretos estão de parabéns, deram uma lição de mobilização popular, de espírito de defesa da universidade pública, de criatividade de métodos de ação e de capacidade de negociação política – intermediados pela excelente comissão de professores que serviram como facilitadores. A USP, seus professores, estudantes, funcionários, tem que sair muito contentes e incentivados a seguir na organização e na luta pelo fortalecimento do caráter público da USP.

Grande parte das reivindicações internas à USP foram conseguidas, foi freado o projeto do governador de São Paulo para violar mais ainda a autonomia universitária, foi impedida a intervenção militar preparada pelo governo tucano no campus da universidade, foi chamada a atenção sobre a situação da USP e ficou claro que há força entre os estudantes, professores e funcionários, para defender os interesses da universidade. O que não é pouco em tempos de grandes desmobilização – em particular da juventude -, de ataques sistemáticos às universidades públicas – veja a violenta ação da polícia em Araraquara -, de ideologia da privatização do ensino, de mídia que desqualifica tudo o que é público, de desvalorização das mobilizações e das lutas de massa diretas.

O ódio concentrado da direita e de seus porta-vozes, a ação totalitária da mídia contra a mobilização servem para confirmar como ela tocou em um ponto sensível do neoliberalismo – a autonomia das universidades públicas – e como incomoda ao coro uniforme dos papagaios bushistas na imprensa oligárquica. Saem derrotados, uma vez mais.

É assim que se combate ao neoliberalismo. Com um Congresso como o do MST, em Brasilia, com 18 mil participantes fazendo um balanço sério e profundo das lutas pela reforma agrária e elaborando novo plano político e de massas para dar seguimento a suas lutas –que são as de todo o Brasil – e com mobilizações como a de 50 dias na USP. A ação desinformadora da mídia oligopólica, o enfoque redutivo nos escândalos no Congresso, a desqualificação de tudo o que não seja neoliberal – saem derrotados dessas mobilizações. Querem demonstrar que as lutas não valem a pena, que estão derrotados de antemão, que não há força contra o poder do dinheiro e o do monopólio da palavra que pretendem exercer.

Quando as lutas unificam, fortalecem a confiança em todos de que governos prepotentes como o de São Paulo podem ser derrotados, que as mobilizações populares previsam ser revigoradas, com uma nova plataforma anti-neoliberal, que articule reivindicações dos mais amplos setores sociais, que concentre seus esforços na ruptura do modelo predominante e proponha não apenas objetivos, mas meios pelos quais chegar até eles.

O pós-neoliberalismo terá no fortalecimento da esfera pública um eixo fundamental de reorganização do Estado e de sua relação com a sociedade no seu conjunto. Nessa direção, a vitoriosa luta dos estudantes, funcionários e professores da USP pode ser um passo na construção da força social e política do movimento popular brasileiro.

Biocombustível, o mito do biocombustível limpo

Considerado a grande solução para os problemas do aquecimento global, o biocombustível e sua produção foram analisados pelo pós-doutor em química Arnaldo Cardoso. Em um trabalho intitulado “Biocombustível, o mito do biocombustível limpo”, o professor afirma que “esta qualidade da limpeza do álcool ainda está longe de ser real e continuamos emitindo poluentes para a atmosfera e poluindo nossas cidades, campos, rios e florestas”. A IHU On-Line entrevistou, por telefone, o professor Arnaldo Cardoso, para entender suas questões contra o chamado “biocombustível limpo”.

Durante a conversa, Arnaldo diz que não existe biocombustível limpo, mas sim combustível renovável, pois “quando lembramos de algo limpo, lembramos também do que não afeta o meio ambiente. O álcool, que é o combustível mais comum, utilizado em grande escala no Brasil, não é limpo”. Na entrevista, Arnaldo fala ainda dos incentivos governamentais em relação à produção do biocombustível e apresenta algumas alternativas para a questão da poluição.

Arnaldo Alves Cardoso é graduado em química pela Universidade de São Paulo. Na mesma universidade, concluiu seu mestrado e doutorado em química analítica. Na Texas Tech University, nos Estados Unidos, concluiu seu pós-doutorado em 1995. Em 1999, obteve o título de Livre Docência pela Universidade Estadual de São Paulo. Atualmente, Arnaldo trabalha na Sociedade Brasileira de Química e é professor da UNESP. Nesta universidade, desenvolve pesquisas como o desenvolvimento de método analítico para determinação de ozônio no ambiente e estudos sobre compostos de nitrogênio, presentes na atmosfera da região central do Estado de São Paulo. É autor de “Introdução à Química Ambiental” (Porto Alegre, ed. Bookman, 2004).

Confira a entrevista.

IHU On-Line - O que existe hoje por trás do que se chama de biocombustível limpo?

Arnaldo Cardoso - A questão principal que estamos tentando discutir é que não existe isso que chamamos de biocombustível limpo. O que existe, na verdade, é um combustível renovável, o que é diferente. Quando lembramos de algo limpo, lembramos também do que não afeta o meio ambiente. O álcool, que é o combustível mais comum e utilizado em grande escala no Brasil, não é limpo. Um problema ambiental grave no momento é o aquecimento global, resultado de um acúmulo de gás carbônico na atmosfera. Todo combustível que adiciona gás carbônico na atmosfera está sujando, comprometendo a qualidade da atmosfera, e aumentando, portanto, o efeito estufa.

O álcool tem a seguinte propriedade: ele emite o gás carbônico quando queima o combustível. Só que a cana, quando cresce pelo processo de fotossíntese, retira o seu gás carbônico da atmosfera para transformar-se em uma nova planta. O resultado disso é que a utilização de álcool não acrescenta mais gás carbônico na atmosfera. Sob o aspecto estritamente do gás carbônico, ele pode ser considerado um combustível limpo. Quando se planta a cana, é necessário adicionar fertilizantes que entrem no ambiente e não circulem da mesma forma que o gás carbônico. O álcool, por sua vez, não tem um processo em que seja novamente reciclado.

IHU On-Line - Então, como a questão ambiental é afetada?

Arnaldo Cardoso - É afetada justamente pelo acúmulo de poluição. Se você coloca fertilizante, está modificando o meio ambiente. O álcool, portanto, não pode ser considerado um combustível limpo nem no momento em que se planta a cana. Outro problema é quando o álcool queima, emitindo óxidos de nitrogênio, que são responsáveis pela chuva ácida nas cidades. Mesmo a utilização do álcool, no fundo, em relação a outros poluentes, não pode ser considerada limpa, como afirmei. A imprensa precisa modificar essa forma de chamar o combustível. No momento em que ele é considerado limpo, significa que ao se usar um carro à vontade não se estará afetando o ambiente. Ora, nós temos que lembrar sempre que a utilização do álcool precisa ser feita de forma restrita e economizar combustível, para justamente não afetarmos ainda mais o ambiente. Devemos, também, lembrar que o combustível é apenas renovável.

IHU On-Line - Para o senhor, com o governo incentivando cada vez mais a produção do etanol, que tipo de conseqüência haverá no futuro se a produção e o consumo de álcool for maior do que é hoje o consumo de gasolina?

Arnaldo Cardoso - A questão principal que deve ser encarada por todos é que precisamos mudar nosso conceito de consumo de combustível. É claro que o álcool tem a vantagem de não aumentar o efeito estufa, o que é uma característica relevante, mas não podemos substituir a gasolina pelo álcool. Isso não resolverá o problema do planeta. Precisamos pensar em ter uma contribuição de álcool, aumentar a geração de energia eólica e diversificar as fontes de energia. Da forma que está sendo colocada pelo governo, parece que a salvação do planeta passa pela produção do biodiesel. No meu entendimento, reafirmo que isso não é possível, à medida que ele tem um limite de produção e afeta bastante o meio ambiente, assim como todo combustível. A própria produção de petróleo é altamente prejudicial à vida. Em lugares de onde se extrai petróleo, costuma haver o problema de navios que o despejam em alto-mar. Ou seja, a produção de combustível é sempre danosa, seja do biocombustível, seja do combustível fóssil.

IHU On-Line - O artigo que o senhor escreveu, “O mito do biocombustível limpo”, fala dos graves problemas da emissão de nitrogênio. Que tipos de métodos analíticos para aplicação em várias áreas poderiam suprir essa necessidade do uso de nitrogênio?

Arnaldo Cardoso - O nitrogênio é um dos macroconstituintes dos seres vivos. Sempre que se cria um novo organismo, vai se precisar de todos esses elementos. E caso se queira plantar soja, é preciso adicionar nitrogênio para o crescimento dos vegetais. Assim, passamos a ter uma grande quantidade de nitrogênio no ambiente, mas é impossível segurá-lo só no solo, isto é, apenas no local onde se quer produzir. Parte desse nitrogênio se espalha. Se ele cai numa floresta, facilitará o crescimento de vegetais e modificará a biodiversidade local. As plantas que precisam de mais nitrogênio serão favorecidas, mas outros não terão a mesma facilidade. Com isso, é possível modificar ambientes naturais. O grande problema do nitrogênio é esse.

Quanto à parte de análise química desses compostos de nitrogênio, existe a necessidade, por exemplo, de controlar o pH da chuva. É importante determinar sua acidez e entender se ela origina-se do hidrogênio. É importante, ao mesmo tempo, controlar a concentração de óxido de nitrogênio na atmosfera, porque ele atua como catalisador da formação de ozônio na atmosfera das cidades. Se há muito óxido de nitrogênio, pode-se ter muito ozônio, um composto mais prejudicial à saúde. Para fazer o controle, é necessário se fazer determinações de óxido de nitrogênio.

IHU On-Line - Há pouco tempo, Fidel Castro falou, em um artigo, que os Estados Unidos, para satisfazer a demanda atual de combustível fóssil, necessita destinar 121 % de toda superfície agrícola para a produção de biocombustível do país. Para o senhor, o que os governantes devem fazer para alertar e produzir racionalmente o biocombustível?

Arnaldo Cardoso - A questão é que nós, a meu ver, produziremos tanto biocombustível quanto se produz combustível do petróleo. Buscar essa meta é um grande erro. Para mim, precisamos reduzir a quantidade de combustível. O biocombustível pode fazer parte de uma solução, mas ele não é a solução. Não podemos imaginar jamais em substituir o petróleo por ele. Teríamos que produzir tanto adubo, utilizar tanta terra, que haveria problemas ambientais no futuro. A utilização dessa terra pode provocar problemas ambientais, como já foi observado, a exemplo da chuva ácida e da formação de ozônio. Busca-se o biocombustível para se resolver um problema global, mas a produção e a utilização dele cria problemas de poluição local.

Para termos uma idéia, em São Paulo, segundo dados da Cetesb em relação a 2005, 330.000 toneladas de óxido de nitrogênio foram emitidas por diversas fontes, sendo que 96% foi proveniente de automóveis. É uma quantidade muito grande de óxido de nitrogênio. Sabemos que a maior parte dessa frota é movida a álcool, ou, pelo menos, 25% de gasolina com álcool. Não estamos resolvendo um problema local. A poluição de São Paulo é grande e o biocombustível não vai resolver esse problema. Precisamos caminhar em outra direção, e a solução é consumir menos combustível.

IHU On-Line - O senhor tem alguma alternativa de política pública para reduzir o consumo de combustível?

Arnaldo Cardoso - A política pública é aquela que todo mundo pede. Precisamos programar um transporte público decente, porque ele, no Brasil, é quase impraticável para as pessoas utilizarem. Não só pelo excesso de pessoas transportadas, mas também até pela dificuldade de tempo entre um veículo e outro. Precisamos criar outras alternativas, como o uso de bicicleta, quando possível. Cidades pequenas, planas, precisam de ciclovias. São várias coisas que precisamos fazer, principalmente em relação ao transporte. O Brasil é um dos vilões em termos de gasto de combustível.

IHU On-Line - Temos algum exemplo de um país que tem trabalhado para esta redução?

Arnaldo Cardoso - Os países da Europa sempre tiveram essa preocupação. Darei o exemplo da cidade de onde estou falando: Araraquara. Eu vim de São Paulo em 1987, e o transporte público aqui era todo com ônibus elétricos, ou seja, com emissão praticamente nula de poluentes para a atmosfera. Hoje não existe mais o ônibus elétrico, ou seja, caminhamos em uma direção completamente diferente do que a Europa está fazendo. Em várias cidades da Europa existem bondes circulando. As pessoas precisam se preocupar com esse tipo de coisa. Não é o automóvel que solucionará o problema do transporte. Hoje em dia, é inviável se locomover na cidade com essa quantidade de automóveis. Não conseguimos mais viver em uma cidade grande ou média à custa de um automóvel. Precisamos caminhar em uma outra direção, ou seja, a cidade precisa ser repensada. Na minha opinião, devemos restringir cada vez mais o acesso de automóvel ao centro das cidades. As pessoas precisam parar de fazer tanta academia e andar mais a pé.

O importante é afirmar que o biocombustível deve ser utilizado com moderação, pois não vamos salvar o planeta com ele. É preciso saber que a sua utilização não minimiza o problema de poluição das grandes cidades.




Fonte: http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=7078

Biocombustível, o mito do combustível limpo. Washington Novaes comenta pesquisa de especialista

"Para chamar álcool combustível de limpo é necessário colocar muita sujeira debaixo do tapete", escreve Washington Novaes, comentando o trabalho Biocombustível, o mito do combustível limpo, do professor Arnaldo Alves Cardoso, do Instituto de Química de Araraquara (Unesp), em artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, 11-05-2007, sob o título O debate crucial dos próximos anos . Segundo Novaes, "no caso da exportação, iremos arcar com os prejuízos ambientais da produção".

Eis o artigo.

"Quem esteja acompanhando minimamente o noticiário sobre mudanças climáticas sabe que a questão central dos próximos anos e décadas no mundo e no Brasil será a energia - que fontes vamos usar, que vantagens e conseqüências negativas pode ter cada uma delas. O caso do etanol, o álcool da cana-de-açúcar, é uma dessas questões que já ocupam largo espaço na comunicação.

Terá o etanol impacto inflacionário (Estado, 7/5), como temem analistas do Banco de Compensações Internacionais, por aumentar a demanda de milho (ou de cana) e a escassez de terra para outros alimentos? Exigirá a Europa certificação do etanol brasileiro, para evitar ocupação de áreas do Pantanal e da Amazônia pela cana (Estado, 17/4)? Falta-nos um marco regulatório para essa área, como afirma o ex-embaixador nos Estados Unidos Rubens Barbosa (24/4)? A expansão da cana voltou a aumentar o preço das terras e a expulsar para mais longe culturas de alimentos e pecuária (15/4)? O etanol usado como combustível é um risco para a saúde humana (Stanford Report, 15/2)? É insalubre e injusto o regime de trabalho nas culturas de cana, que exige do trabalhador cortar de 10 a 15 toneladas diárias para ganhar entre R$ 24 e R$ 36 diários - obrigando esse cortador a desferir a cada dia milhares de golpes de facão, carregar 800 feixes de 15 quilos, segundo depoimentos?

E a oferta de energia? Precisamos mesmo de megahidrelétricas na Amazônia e em outras partes, com elevados custos financeiros, sociais e ambientais? Ou podemos até reduzir em mais de 30% nosso consumo, com programas eficientes de conservação e eficiência energética, como afirmam alguns estudos de universidades já citados aqui? Se as hidrelétricas não forem licenciadas, teremos de recorrer à energia nuclear (muito mais cara, insegura, sem solução para o problema do lixo nuclear), como ameaça o presidente da República?

Tudo isso está nos jornais e na TV. Mas não está num debate aprofundado de todas essas questões, liderado pelo próprio governo federal, como deveria ser - para que a sociedade pudesse informar-se com segurança, participar, opinar, como deve ser numa democracia. Mesmo no caso do etanol, além das questões mencionadas acima, muitas outras já deveriam estar nessa pauta - como a necessidade de um zoneamento para a expansão; as implicações das monoculturas; a garantia de suprimento (para evitar desabastecimento como em 1989/1990); e outras implicações da cultura da cana na chamada área ambiental e na de saúde.

Um trabalho que chama a atenção para isso é Biocombustível, o mito do combustível limpo, do professor Arnaldo Alves Cardoso, do Instituto de Química de Araraquara (Unesp). Começa ele lembrando que “esta qualidade da limpeza do álcool ainda está longe de ser real e continuamos emitindo poluentes para a atmosfera e poluindo nossas cidades, campos, rios e florestas”. Porque, se o etanol tem um balanço zero no que diz respeito ao efeito estufa (o carbono emitido na queima de combustível volta a se fixar na cana durante o seu crescimento) - e desse ponto de vista é mais adequado que os combustíveis fósseis -, há outros problemas a considerar com elementos incorporados sob a forma de adubo no processo de crescimento da planta (enxofre, nitrogênio, fósforo e potássio).

Enfatiza o estudo que “já dobrou a quantidade de nitrogênio ativo, que tem atividade química e biológica, com potencial para modificar o meio ambiente” (estudos internacionais recentes dizem que o nitrogênio carreado para os oceanos pela dispersão de fertilizantes - 100 milhões de toneladas anuais - já é um dos mais graves problemas para as águas marinhas). Entre outros danos, ele provoca a chuva ácida, a contaminação das águas e prejuízos para a biodiversidade de florestas naturais. E, como é solúvel na água, pode provocar efeitos indesejáveis “a centenas de quilômetros do local onde foi formado”. Além desse arraste para rios e lagos, problemas podem advir da ação de microrganismos no solo, transformando parte do adubo em gases ou de bactérias em raízes de leguminosas, tornando ativo o nitrogênio inerte do ar. E também com a formação de gases nitrogenados na combustão: “A cultura da cana, direta ou indiretamente, atua nesses quatro mecanismos de formação e dispersão de nitrogênio ativo no ambiente, já que a cada ano se utilizam 100 quilos de fertilizantes por hectare.”

Quando ocorre a queima da palha da cana, “só no Estado de São Paulo se emitem por ano cerca de 46 mil toneladas de nitrogênio ativo para a atmosfera”. A elas deve ser adicionado o nitrogênio gerado na combustão do etanol nos motores. Por isso, “todos os rios e lagos do Estado de São Paulo estão recebendo excesso de nitrogênio ativo”, que favorece o crescimento de grandes quantidades de algas e plantas, “e estas em algum momento apodrecerão e morrerão, modificando a qualidade da água. Processo similar pode ocorrer em florestas preservadas”.

Para complicar mais, parte do nitrogênio transforma-se em ácido nítrico e forma a chuva ácida. Pode também catalisar reações atmosféricas, gerando ozônio, “um grande vilão (para a saúde humana) quando formado na baixa atmosfera”. E ainda não é tudo: a queima da palha da cana emite outros gases e material particulado; a queima do álcool emite formaldeído e acetaldeído, vapores tóxicos (embora menos que o monóxido de carbono, o dióxido de enxofre e material particulado dos derivados do petróleo).

Conclui o trabalho que “para chamar álcool combustível de limpo é necessário colocar muita sujeira debaixo do tapete”. Lembrando ainda que, no caso da exportação, “iremos arcar com os prejuízos ambientais da produção”. Por isso, como no caso da matriz energética brasileira, nesta hora crucial, é preciso pôr sobre a mesa também a questão do etanol. É um direito da sociedade.'