07 julho, 2007

CARTA DA RENAJU contra a homofobia

Sobre as manifestações opressoras de oposição ao Projeto de Lei nº 122/2006.


A RENAJU - Rede Nacional de Assessoria Jurídica Universitária - vem, por meio desta e em virtude das discussões acerca do Projeto de Lei nº. 122/2006, em tramitação no Congresso Nacional, que define os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero, posicionar-se contrariamente às manifestações de caráter homofóbico oriundas de setores conservadores da sociedade brasileira. O conteúdo desta carta é resultado dos debates promovidos durante o IX Encontro Nacional da Rede realizado na cidade de Curitiba - PR entre os dias 04 e 08 do mês de abril do presente ano.

O Projeto de Lei nº. 122/2006 modifica, além do Código Penal e da Consolidação das Leis do Trabalho, a Lei 7716/1989. Este último documento legal criminaliza práticas discriminatórias relacionadas a religiosidade, raça, cor, etnia e procedência nacional. Propõe o projeto em questão acrescentar a essa lista as categorias gênero, sexo, orientação sexual e identidade sexual. Parte ele do entendimento de que as opressões sociais racismo, machismo e homofobia devem ser combatidas em nome da efetivação do Estado Democrático de Direito. Seguem abaixo trechos da justificação constante no projeto:

"(...) como legisladores, temos o dever de encontrar mecanismos que assegurem os direitos humanos, a dignidade e a cidadania das pessoas, independente de raça, cor, religião, opinião política, sexo ou orientação
sexual.

A orientação sexual é direito personalíssimo, atributo inerente e inegável à pessoa humana. E como direito fundamental, surge do prolongamento dos direitos da personalidade, como direitos imprescindíveis para a construção de uma sociedade que se quer livre, justa e igualitária. Não se trata aqui de defender o que é certo ou errado. Trata-se de respeitar as diferenças e assegurar a todos o direito de cidadania.

Temos como responsabilidade a elaboração de leis que levem em conta a diversidade da população brasileira. Nossa principal função como parlamentares é assegurar direitos, independente de nossas escolhas ou valores pessoais. Temos que discutir e assegurar direitos humanos sem hierarquizá-los. Homens, mulheres, portadores de deficiência, homossexuais, negros/negras, crianças e adolescente são sujeitos sociais, portanto sujeitos de direitos. (...)"


A crítica hegemônica ao PL nº. 122/06 pauta-se em argumentos, critérios e valores os quais repudiamos e sobre os quais discorreremos a seguir. Entre esses argumentos está aquele apresentado pelo Promotor de Justiça do Rio Grande do Sul, Cláudio Silva, que afirma que o PL em questão cria privilégios para a comunidade LGBT (Lésbicas, Gays, Bissexuais e Trânsgêneros):

"O Brasil, com tal legislação, estaria instituindo a face mais horrenda do totalitarismo: o Estado decretando uma suposta 'verdade absoluta' - o homossexualismo é uma virtude - e proibindo qualquer oposição a essa 'verdade' sob pena de prisão."

Tal argumento sustenta que o/a cidadão(ã) homossexual conquistaria mais direitos que os/as cidadãos heterossexuais. O PL, no entanto, de forma alguma concede privilégios a um sujeito pelo fato de ele ser homossexual. Pelo contrário: trata de "qualquer orientação sexual" e não apenas da homossexulidade e, ao visibilizar a existência da homofobia, assegura ao grupo social oprimido o acesso aos mesmos direitos previstos aos/às demais cidadãos(ãs). Nesse sentido, o Projeto proíbe e penaliza discriminações ou preconceitos de gênero, sexo, orientação sexual e identidade de gênero no tocante a, por exemplo, o ingresso, permanência e/ou atendimento em qualquer ambiente ou estabelecimento público ou privado aberto ao público e à realização de exame, seleção ou entrevista para ingresso em emprego, concursos públicos e sistemas educacionais.

Outro dos argumentos conservadores recorrentes refere-se à interpretação dada ao Art. 7º do Projeto de Lei nº. 122/06 que fala da manifestação pública de afetividades entre pessoas do mesmo sexo. Diz-se que tal ação constituiria obscenidade e imoralidade, que atentaria contra os valores da família e da sociedade. Entretanto, até uma leitura simplista do referido artigo mostra que essa manifestação de afetividade é a mesma permitida aos/às demais cidadãos(ãs). Quer-se com isso dizer que a liberdade que um casal homossexual possui de expressar carinho publicamente deve ser a mesma de um casal heterossexual, precisando, por isso, ser respeitada. Convém ressaltar, que a demonstração de afetividade independe de lei que a institua, o que se pretende com a legislação é garantir proteção para aqueles se sintam a vontade em demonstrá-la, sem medo de ser repreendido ou insultado.

Argumento ainda mais grave é aquele que critica o Projeto em razão das supostas violações às liberdades de expressão, de pensamento e de religião. Alega-se que a criminalização da homofobia levaria à supressão dos direitos de fala e de credo daqueles sujeitos que, por motivos religiosos ou ideológicos, discordem das práticas de sexualidade não-heterossexuais. Afirma-se ainda que a democracia seria ameaçada por um "totalitarismo gay" que colocaria em risco os direitos individuais.

Esse argumento ignora a ponderação entre princípios jurídicos. O fato de a liberdade de expressão ser um direito fundamental não autoriza ninguém a, com suas palavras e seus gestos, ofender e oprimir outra pessoa por ser ela branca ou negra, homem ou mulher, criança, adolescente, adulto ou idoso, com deficiência, moradora do centro da metrópole ou da periferia, heterossexual, bissexual, homossexual ou transgênero etc. O mesmo se aplica à liberdade religiosa. O fato de ser ela também um direito fundamental não legitima que, por exemplo, um católico, um muçulmano ou um judeu, em nome de sua fé, agrida verbal ou fisicamente quem quer que dele discorde. Isto porque é o Brasil um Estado laico e, como tal, garante a pluralidade religiosa e inclusive o ateísmo. Desse modo não pode uma certa religiosidade, que julga ser a homossexualidade um pecado, ter essa opinião imposta a todos(as) os cidadãos(as) através do Estado. Do contrário, estaria aí sim em xeque a democracia. Haveria, então, um totalitarismo.

Com a consciência de que a edição de uma lei penal, por si só, não é suficiente para a eliminação da homofobia, a Rede Nacional de Assessoria Jurídica Universitária reafirma seu compromisso com a radical efetivação dos direitos humanos e com a luta contra quaisquer formas de opressão, repudiando os argumentos preconceituosos dos setores conservadores de nossa sociedade referentes à discussão do Projeto de Lei 122/2006 e apoiando a militância do movimento de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros.

Curitiba, 07 de Abril de 2007.


Rede Nacional de Assessoria Jurídica Universitária

NAJUPAK - Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Aldeia Kaiapó - UFPA

NAJUP - Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular - Isa Cunha - UFPA

NAJUP - Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular - Negro Cosme - UFMA

NAJUP - Núcleo de Assessoria Jurídica Popular - Direito nas Ruas - UFPE

CAJUÍNA - Centro de Assessoria Jurídica Universitária Popular de Teresina - UFPI

NAJUC - Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Comunitária - Justiça e Atitude - Instituto Camillo Filho - PI

CAJUP - Centro de Assessoria Jurídica Universitária Popular - Mandacaru - CEUT - PI

CAJU - Centro de Assessoria Jurídica Universitária - UFC

NAJUC - Núcleo de Assessoria Jurídica Comunitária - UFC

SAJU - Serviço de Assessoria Jurídica Popular - UNIFOR / CE

PAJE - Programa de Assessoria Jurídica Estudantil - URCA / CE

NAJUP - Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular - UFG

SAJU - Serviço de Assessoria Jurídica Universitária - USP

NAJUP - Núcleo de Assessoria Jurídica Popular - PUC - RS

SAJU - Serviço de Assessoria Jurídica Universitária - UFRGS

CAJU - Centro de Assessoria Jurídica Universitária - Sapé Tiaraju - Passo Fundo / RS

NAJUP - Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular - Roda Viva - UCS / RS

NIJUC - Núcleo de Interação Jurídica Comunitária - UFSM / RS

SAJUP - Serviço de Assessoria Jurídica Universitária Popular - UFPR

SAJU - Serviço de Assessoria Jurídica Universitária - UFBA

Projeto Estação de Direitos - RN

Um comentário:

Luiz Otávio Ribas disse...

Olá companheiro


Dá uma olhada no blogue:
http://assessoriajuridicapopular.blogspot.com

Um abraço