15 maio, 2006

Afirmar uma oposição de esquerda de massas e unir a esquerda socialista!

Apresentação

Esta contribuição é uma síntese das posições apresentadas no documento AFIRMAR UM PROJETO SOCIALISTA PARA O BRASIL. O objetivo aqui é dar ênfase aos temas políticos que estão centralmente na pauta do debate na conferência do partido.

Introdução

A disputa eleitoral de 2006 será um fator de polarização política no país de primeira grandeza. Mas como tem sido parte da história dos processos eleitorais no nosso país estamos as portas de um novo embuste eleitoral. A tentativa de mostrar a população que a polarização que se avizinha entre governo Lula (PT, PCdoB, PSB e o conjunto do bloco governista) versus PSDB/PFL é uma polarização entre “esquerda e direita”, entre um suposto campo progressista do qual Lula seria porta voz no país, contra “a volta da direita”.

O nosso partido e o bloco de aliados que se constituir em torno dele tem na candidatura da companheira Heloísa Helena, nas candidaturas majoritárias e proporcionais nos estados, e na nossa força militante, tem o desafio de romper essa falsa polarização. Mas não apenas o desafio: temos também as condições para expressar a resistência acumulada durante o atual governo, para a nossa candidatura ser um fator de recomposição de forças nos movimentos sociais e nas classes trabalhadoras, de construir condições para transformar a campanha em uma aula de unidade da esquerda socialista e assim fortalecer as condições para afirmarmos um novo projeto socialista de massas no país.

Assim, as eleições de 2006 devem ser aproveitadas para afirmarmos um novo projeto em todos os sentidos: o resgate de bandeiras e posições históricas das classes trabalhadoras, a disputa ideológica da consciência no sentido de um horizonte socialista, o fortalecimento do projeto partidário, o acúmulo de influência e inserção da esquerda socialista nos movimentos sociais das classes trabalhadoras, para denunciar e desmistificar a podridão das instituições do regime político vigente e afirmar a busca da organização independente dos explorados.

Temos, portanto, possibilidade de disputar um amplo público na população: os trabalhadores dos setores mais organizados das classes trabalhadoras, como os do setor público e de estatais (justamente os mais atacados), as camadas de milhões de jovens que vivem as voltas com a busca de um primeiro emprego, com as péssimas condições da educação pública e com as mazelas da violência nos grandes centros urbanos e que não têm nada a ver com a falência e crise do período anterior na esquerda brasileira, setores assalariados e das classes médias, mais ligados às idéias de esquerda e que se indignaram com a falência moral do PT, setores da pequena burguesia e das classes médias na cidade e no campo, esmagados pela política de arrocho do capital financeiro e pala concentração de capital e de meios de produção nas mãos de grandes grupos capitalistas transnacionais e nacionais.

Afirmar a oposição de esquerda socialista

Temos centralmente dois objetivos: a afirmação da oposição da esquerda socialista com peso de massas, para mostrar que a esquerda não acabou em Lula e no PT, e a unidade da esquerda socialista em uma frente político eleitoral capaz de ampliar e dialogar com amplos setores nos movimentos sociais que mesmo sem terem filiação partidária estejam dispostos a caminhar juntos nessa nova jornada.

Em relação ao primeiro objetivo significa que a marca da apresentação de um perfil independente e classista dos socialistas nas eleições deve ser a oposição de esquerda clara ao governo Lula, a diferenciação frontal com suas políticas neoliberais, anti-nacionais e antipopulares, sem deixar de denunciar e ser oposição às mesmas políticas do bloco PSDB-PFL. Ser uma oposição de esquerda conseqüente é ser oposição ao conjunto do bloco dominante: a Lula e ao PT que são governo, e também ao bloco PSDB-PFL, e ao PMDB e aos seus respectivos governos estaduais e municipais, que em linhas gerais estão no marco do mesmo projeto de subordinação ao mercado financeiro.

A afirmação da oposição de esquerda também deve se dar na construção de uma política nos movimentos sociais que tenha como norte a unidade estratégica de todos os setores que resistem à aplicação da atual política econômica e suas mazelas sociais.

A luta pela reconstituição de um bloco histórico das classes trabalhadoras e seus aliados - a pequena burguesia e as classes médias - deve ser o norte estratégico que orienta nossas definições táticas.

Política eleitoral de alianças: construir a frente da esquerda socialista

O outro objetivo que potencializa e se articula com o primeiro é a formação de uma frente eleitoral de esquerda socialista.

É uma necessidade para as classes trabalhadoras no nosso país o resgate da cultura da independência política dos trabalhadores, que passa também por uma política de alianças, no terreno eleitoral, coerente com esse objetivo. É justo e necessário lutar por uma política de alianças ampla, tanto nos movimentos da classe trabalhadora como nas eleições. Na nossa visão, no entanto, essa busca de ampliação tem uma direção certa: a dos movimentos dos explorados e oprimidos, das classes médias arruinadas e arrochadas pelo capital, camadas da intelectualidade, os setores médios e da pequena-burguesia atingidos pelas mazelas do capital e que não têm, em geral, representações partidárias próprias.

Nossa proposta de frente de esquerda política e social em torno das eleições de 2006 deve comportar uma aliança que no terreno partidário envolve PSOL, PCB e PSTU, buscando ampliar com setores combativos dos movimentos sociais das classes trabalhadoras que queiram construir esse diálogo, como os companheiros da Consulta Popular e do MST, que objetivamente se enfrentam com os limites da política neoliberal do governo Lula, como evidenciado no recente choque com os números oficiais do governo sobre os assentamentos.

O alto grau de adaptação à institucionalidade, ao Estado e aos interesses eleitorais regionais que já engoliram partidos de origem na classe trabalhadora como o PT e o PCdoB, também corroeu representações que oscilam do centro para a centro esquerda no país. Nesse momento, partidos como PV, PSB, PPS e PDT buscam barganhar uma melhor localização para sobrevivência dos seus mandatos e governos estaduais. O mesmo já se aplica ao PMDB diante da sua brutal crise em torno de ter candidatura própria ou aderir a um dos blocos majoritários. Não é estranho que esses partidos, suas camarilhas regionais e personalidades oscilem da base governista federal para a base governista de governos estaduais e municipais do PSDB. Pois agora o que vai prevalecer é o melhor movimento tático para preservar seus interesses setoriais no aparelho de estado.

Diretrizes programáticas: a natureza do programa é de ruptura

Do ponto de vista do programa, o essencial será a defesa de um programa sólido de ruptura com o modelo, que aponte em primeiro lugar suas diretrizes gerais na direção do seu caráter antiimperialista, anti-mercado financeiro, anticapitalista e de profundo corte em favor das demandas sociais e populares.

O balanço do fracasso do ciclo histórico na esquerda brasileira evidenciado agora no desastre do governo Lula é mais uma demonstração da inviabilidade da eterna busca de setores da esquerda de parceiros para um programa nacional-desenvolvimentista ou keynesiano que sempre acaba terminando em concessões ao Estado e aos setores burgueses hegemônicos, pois o nível de integração e associação do capital nacional, da burguesia de país dependentes e semicoloniais no início do século 21 faz com que a retomada de ilusões de que um programa dessa natureza possa sinalizar um caminho da ruptura do Brasil com as amarras da escravidão e dependência do grande capital, não irá além de uma nova caricatura daquilo que levou a seguidas frustrações desde o pós 2ª guerra do século passado.

As diretrizes de um programa de ruptura pressupõe a compreensão de que a articulação entre as tarefas nacionais e democráticas se dão com as tarefas de emancipação socialista, de superação do capitalismo. Este sentido estratégico do nosso programa significa também uma ruptura com o ciclo recente predominante na esquerda brasileira, o de que as tarefas de modificações sociais passavam pelo etapismo embutido na visão do chamado programa democrático e popular, que também deve ser superado como parte da superação do PT.

A questão da dívida pública externa e interna (na direção da ruptura) em ligação com a defesa das reivindicações e reformas sociais e populares é um dos centros das diretrizes programáticas.

Um programa com diretrizes gerais de ruptura permite apresentar medidas à população durante a campanha eleitoral que apontem ao centro dos problemas. Por exemplo, uma campanha presidencial nossa deve dizer que nosso governo irá romper com o pagamento da dívida externa e abrirá uma auditoria cidadã da dívida interna, porque não vamos mais consumir o orçamento no pagamento da agiotagem aos banqueiros. Esta política de auditoria da dívida interna também nos permite estabelecer uma aliança com as classes médias e a pequena burguesia, pois não é contra ela que as medidas do nosso programa se dirigem. Estamos a favor de anular a dívida com os grandes bancos e especuladores e preservar os investimentos dos médios e pequenos poupadores.

Isso se traduz na ruptura com os mecanismos de dominação do capital internacional imperialista sobre o país, na quebra do controle do capital internacional sobre a economia brasileira. Para além da questão da dívida, medidas concretas que caminhem na direção de uma “re-nacionalização” da economia - como, por exemplo, reestatização das empresas públicas entregues ao capital internacional, entre outras - devem constituir fundamentos de um programa e sempre articuladas com a defesa das reivindicações e demandas populares.

A outra diretriz fundamental tem a ver com a questão do poder. Nas condições atuais de extremo desgaste das instituições do regime político são imprescindíveis reivindicações verdadeiramente democráticas, que busquem convencer o povo a desenvolver mecanismos de deliberação e participação popular superiores ao simples voto a cada dois anos. Não se trata apenas de denunciar a podridão do regime democrático-burguês, mas de estimular os movimentos sociais à auto-organização independente, com formas deliberativas de democracia direta, como os Conselhos Populares - bandeira histórica de poder das classes trabalhadoras que precisa ressurgir num programa que pretenda ajudar na construção de alternativas de poder dos explorados rumo ao socialismo.

Partido: elementos de concepção e perfil do PSOL

O primeiro parâmetro que devemos ter no debate de concepção de partido é que estamos em uma fase de recomposição de forças da esquerda socialista, marxista e revolucionária. Início de uma recomposição, produto de muitas cisões, derrotas e fragmentações, e também de um período histórico em escala internacional onde a relação de forças é francamente desfavorável em linhas gerais desde o início dos anos 90. Significa que estamos tentando recompor marcos políticos e partidários em meio a uma ausência de projetos construídos e testados em uma situação de ascenso ou grandes triunfos das classes trabalhadoras.

Nesse sentido, a formação do PSOL e sua ampliação constituída neste ano foram acertos históricos, mas isso significa que os próximos passos em direção à consolidação de um grande partido de esquerda socialista e anticapitalista devem garantir um processo de convivência, diálogo, confrontação de posições, capazes de permitir a constituição de instâncias partidárias sólidas e duradouras, que tenham nos núcleos a sua estrutura fundamental de organização militante, e isso só será possível se os núcleos forem espaços de reais de discussão e deliberação. Pois a idéia de partido, como organizador de militância e de idéias só poderá ser revitalizada se suas instâncias de base forem espaços reais de discussão e deliberação.

Não acreditamos em qualquer concepção substitucionista de partido, de partido como fim em si mesmo, ou que dá ordens aos trabalhadores com seus comandantes em chefe ou secretários gerais. Uma das principais lições do século XX é que a concepção de partido que substitui a classe e sua própria organização independente deve ser varrida, pois a disputa de hegemonia e de direção política nas classes trabalhadoras se faz antes de tudo impulsionando a sua mobilização e organização independente e autônoma.

Em relação à institucionalidade, um novo e renovado partido anticapitalista e socialista nasce para afirmar uma estratégia extra-institucional, mesmo (e talvez principalmente) na disputa institucional. Nasce para fazer um tipo de política e uma política de alianças sem concessões aos clientelismos da política burguesa brasileira, sem concessões aos financiamentos empresariais de campanha e sem compromissos com setores das classes dominantes ou lobbies para-estatais para disputar postos e mandatos.

Ou seja, precisamos superar também o modelo partidário do PT, que se consolidou como uma máquina burocrática, onde o poder de decisão da base foi transformado em caricatura diante do poder real das máquinas de governos e mandatos institucionais, não apenas como fonte de poder real no partido, mas como aparatos clientelistas para impor a lógica dos “arrastões” de filiados nos dias de prévias e convenções.

Por isso lutamos para que o PSOL seja um partido de militantes, com poder de decisão real nas suas instâncias e não uma máquina ou soma de máquinas de mover listas de filiados, caminho esse que nos condenaria a ser mais uma estrutura amorfa, despolitizada e anti-democrática, como qualquer outra máquina eleitoral partidária convencional da política em nosso país.

Defendemos a construção do PSOL como um partido estratégico, no sentido de ser uma ferramenta, um instrumento para impulsionar a auto-organização e mobilização independente das classes exploradas. Ou seja, de ser um partido de ruptura com a ordem e com o capitalismo. Será com esses pressupostos que o PSOL poderá recompor a idéia de partido, vencer as legítimas desconfianças e o ceticismo que a forma Partido levanta hoje para milhões de trabalhadores e para as novas camadas de jovens lutadores, devido aos desastres da experiência com os modelos de partido social-democrata, stalinista e, no Brasil recente, petista.


Documento do Coletivo Socialismo e Liberdade para a conferência do PSOL.

Reggae e Socialismo: http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=12329912

Fotolog: http://ubbibr.fotolog.com/mgabriel/

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