07 julho, 2006

A juventude é apenas uma faixa etária?

O que é ser jovem? Um estado de espírito? Possuir certa faixa de idade entre a infância e a fase adulta? Um período de rebeldia sem causa?

O que todos esperam do jovem é que ele estude muito para ser alguém na vida. Ora, o que isso significa senão que ainda somos ninguém? Por isso todos se vêem no direito de controlar nossos sonhos, desejos, prazeres, amizades e sexualidade. Tentam nos ditar como se comportar, como vestir, como amar, se divertir e pensar. Nos limitam nossa liberdade, nos educam, nos moldam, nos adestram. Toda essa disciplinarização tem um único objetivo: nos tornar maduros para a fase adulta. Aprender a respeitar os mais velhos para aprender a respeitar o estado de coisas estabelecidas na nossa sociedade, isto é, aprender a respeitar uma pretensa ordem natural do mundo em que uma minoria detêm todo o poder e riqueza enquanto a grande minoria é obrigada a tentar vender sua força de trabalho para sobreviver.

Em casa são nossos pais que detêm quase todo o poder, por mais democráticos que o sejam. São eles quem decidem em última instância como será gasta a renda familiar e as regras de convivência familiar. Não raro impõem unilateralmente um horário para se chegar em casa, para receber os amigos, para se alimentar, jogar vídeo-game, o local da casa onde namorar (quando é permito trazer o/a companheiro/a em casa!), a programação da TV, etc. Quando o jovem tenta se rebelar contra todas essas imposições logo é colocado em sua testa o rótulo de mal-educado!

Na escola, o jovem se torna o aluno. A origem etimológica desta palavra nos revela a relação: o jovem é tratado como sem luz, sem conteúdo, como um recipiente vazio em que um adulto (o professor!) deve depositar a sabedoria e a luz. Não podemos decidir o que e como aprender, o professor é o dono da verdade, da palavra e das regras em sala de aula. A escola está toda organizada em uma hierarquia em que o diretor está no topo e os alunos na parte mais baixa, quase subterrânea. Qualquer ato de rebeldia contra esta situação é logo punido com notas baixas, suspensões e expulsões. Não raro tratam o problema de violência que existe nas escolas de periferia como um caso de polícia, nunca se procura na desigualdade social a causa desses problemas e dessa forma nunca se encontra solução para estes casos que se reproduzem indefinidamente.

Em busca de liberdade os jovens buscam outros espaços. Entretanto, nos bares e danceterias só existe liberdade para quem pode pagar. Os jovens da periferia buscam, então, as esquinas dos espaços urbanos e logo descobrem através da repressão policial que também esse espaço não pode ser seu. No trabalho se tornam aprendizes, estagiários, trabalhadores menos qualificados e piores remunerados. Isto sem contar a dificuldade de se encontrar emprego que é sempre maior para quem não possui experiência. E os governantes, sempre a serviço das classes dominantes, com o argumento de estarem oferecendo melhores condições para diminuir o desemprego entre os jovens, criam leis que levam a uma sempre crescente precarização do trabalho da juventude.

Nos últimos anos, vimos crescer a chamada “indústria dos estágios”. Esses empregos, que deveriam servir como atividades formativas, viraram contratos temporários e mal pagos. Estagiários são contratados para funções que nada tem a ver com sua formação, pois é melhor pagar R$200,00 para um estagiário do que R$1000,00 para um funcionário “normal”.

As relações sociais assim organizadas funcionam como uma fábrica em que se produz não mercadoria, mas trabalhadores disciplinados. Existiram sociedades em que ser jovem resumia-se a um breve um rito de passagem para a vida adulta, em outras sociedades o conceito de juventude não era nem mesmo conhecido: da infância se passava direto para a fase adulta. É apenas com o aparecimento do capitalismo que juventude ganha o atual significado. Por isso juventude não pode ser vista como uma faixa de idade ou um estado de espírito, mas como um período de opressão em que somos educados à disciplina do trabalho.

Por isso os jovens são obrigados a se rebelar e, ao contrário do que dizem, não se trata de uma rebeldia sem causa. Quando o jovem enfim encara como natural um sistema de opressões e privações diz-se que chegou a maturidade, chegou à fase adulta! A opressão de juventude é uma grande escola da vida em que os jovens são doutrinados a se calar diante do capitalismo. Não à toa, nos momentos de grande contestação social são sempre os jovens os principais protagonistas: se a juventude é a fase da vida em que mais do que qualquer outra somos ensinados a ser trabalhadores disciplinados é porque se trata de um momento da vida em que ainda não internalizamos todos os valores da nossa sociedade de forma passiva.

Muitas vezes a rebeldia da juventude assume forma de contestação puramente individual, expressão inconsciente contra essa opressão que não produz grandes resultados práticos. Por outras vezes, a rebeldia da juventude assume formas mais organizadas, como manifestações culturais que vão contra a cultura estabelecida, em que os jovens exigem uma nova forma de viver sua sexualidade, experimentam novas relações pessoais, produzem sua própria arte (o hip hop, por exemplo) e novos conhecimentos sobre o mundo. Em alguns momentos os jovens chegam mesmo a assumir um papel de impulsionadores de um movimento de massa das classes trabalhadoras em favor do socialismo (a média de idade do Comitê Central do Partido Comunista durante a Revolução Russa de 1917 era menos de 25 anos!). A década de 60 foi um desses momentos: os jovens, ao mesmo tempo, criaram o rock’n’roll, organizaram comunidades hippies e lutaram contra o capitalismo. No Brasil, no mesmo período, foram especialmente os jovens os principais protagonistas da luta contra a ditadura militar.

Foram muitas as conquistas das lutas de juventude; hoje os jovens conseguem ser mais ouvidos e respeitados do que seus pais quando estes eram jovens. Por isso é tão comum ouvir dos nossos pais: “no meu tempo não era assim!”. Contudo, no mundo contemporâneo, outras formas de opressão pesam sobre nossas cabeças. O tão decantado prolongamento da juventude, por exemplo, nada mais é do que uma dependência dos pais prolongada decorrente de um desemprego estrutural de índices alarmantes. Além disso, são os jovens as maiores vítimas de uma sociedade em que o consumo é colocado acima de tudo. Somos bombardeados pela moda e pela mídia que nos oferece inúmeros produtos que jamais poderemos consumir, gerando frustrações e degradando relações pessoais: reduzidos a mero consumidores valemos o quanto possuímos e não por aquilo que somos. Um padrão de estética quase inatingível é exigido, gerando problemas como aneroxia, dependência de anabolizantes, remédios para emagrecer e depressão. Não obstante, a miséria sempre crescente leva ao aumento da criminalidade, prostituição e precarização do trabalho e da educação. Problemas em que são os jovens sempre as maiores vítimas. Mesmo em alguns partidos políticos de esquerda, os jovens são aqueles que colam os cartazes, que distribuem os panfletos, mas não podem participar de nenhum espaço decisório.

É hora de dar um basta a esta situação! Por isso, no Partido Socialismo e Liberdade, os jovens se organizam através de um Setorial de Juventude. Através da Juventude do P-SOL (J-PSOL) nos organizamos para combater todas essas formas de opressão da juventude e lutar contra a precarização do trabalho e por uma educação pública, gratuita, de qualidade e acima de tudo, que forme cidadãos críticos e conscientes. A J-PSOL tem como missão ser um instrumento da juventude para a luta, uma vez que a história demonstra que apenas quando os próprios oprimidos se organizam para o combate é que a situação pode ser mudada. Nos colocamos, desse modo, junto com todo o partido como uma peça fundamental da luta pelo socialismo, mas sem esquecer que a juventude possui suas próprias reivindicações e que apenas através de nossa auto-organização poderemos fazer com que juventude seja, enfim, tão somente uma faixa de idade ou um estado de espírito.


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